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segunda-feira, 28 de abril de 2014

A COPA DO MUNDO SEM MAQUIAGENS

TEXTO DE ERYX PEREIRA




Faltando menos de dois meses para o início da Copa do Mundo, tive a oportunidade de ler, no formato digital, um livro cujo principal objetivo é mostrar os bastidores da preparação do Mundial de futebol, cujos gastos somados quase ultrapassam o que foi gasto na organização dos últimos campeonatos mundiais.

A obra é A Copa Como Ela É - A história de dez anos de preparação para a Copa de 2014, de Jamil Chade (Companhia das Letras). O lançamento se deu no começo de abril apenas em e-book, mas em breve, provavelmente após a Copa do Mundo, sairá a edição impressa e ampliada.

Fato é: a Copa do Mundo de futebol é o maior evento mundial. Isso não se discute. No entanto, após a leitura do livro, que, por sinal, é bem rápida, conclui-se de forma irrefutável: o Brasil perdeu uma oportunidade única de se transformar e de transformar suas cidades.

Chade é correspondente do Estadão na Europa. Durante dez anos, o jornalista acompanhou de perto as negociações que culminaram na escolha do Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014, bem como todas as polêmicas que se seguiram ao anúncio. Como correspondente do jornal na Suíça, Chade teve acesso privilegiado aos corredores da Fifa e às principais figuras que movimentaram o grande balcão de oportunidades que se tornou o Mundial. No livro, o jornalista expõe as tenebrosas transações entre CBF e governo, e mostra como duas entidades supostamente sem fins lucrativos tornaram a Copa de 2014 o evento mais rentável de suas histórias. Seguindo os rastros do dinheiro, Chade revela como políticos e cartolas se apropriaram de um torneio que, se não trouxe ao país o “legado” prometido durante a campanha, serviu para encher (muito) os bolsos de uns poucos na mesma medida que atacou (muito) os cofres públicos.

Partindo deste princípio, assim começa a história da Copa do Mundo mais cara da história. A Copa do Mundo das isenções tributárias e dos lucros de alguns poucos, das contas sem transparência, das “arenas” faraônicas e que, em boa parte, serão de pouquíssima utilidade tão logo a Copa termine, em 13 de julho de 2014.

O livro começa no hall de entrada de um hotel em Zurique. Chade relata que Ricardo Teixeira o teria chamado para conversar e relatado, em 2007: “essa Copa será feita sem um centavo do governo”. Hoje, segundo o que o autor apurou, o que se vê é que, de cada nove dólares gastos em estádios, oito foram emprestados, financiados ou pagos pelo Poder Público. Ela custará três vezes mais que o plano inicial de 2007. Ela custará o equivalente a duas Copas do Mundo. O Brasil gastou em estádios o equivalente ao que a África do Sul e a Alemanha gastaram em 2010 e 2006.

Para Chade, não há o que justifique isso. O autor questiona: “como explicar que uma cidade que tinha o Morumbi construiu um estádio novo? Como justificar que Brasília tem hoje o terceiro estádio mais caro do mundo e sem um time de futebol? Como justificar uma Copa em doze sedes, se a Fifa apenas pediu oito?

Na ótica do autor, “a Fifa usou o Brasil, e não foi o Brasil que usou a Copa”. E complementa que esse talvez tenha sido o maior erro dessa Copa. Referindo-se ao “legado” da Copa, tão defendido pelos organizadores e pelo Governo brasileiro, Chade cita um exemplo paradigmático: todos falam de Barcelona como uma referência em organização de um evento esportivo que mudou uma cidade. Mas, a sua obra nos esclarece, e quase ninguém sabe (inclusive eu) que nos Jogos Olímpicos de 1992, apenas 9% do orçamento de obras foi usado para as instalações esportivas. O restante foi para o aeroporto, avenidas, mobilidade urbana etc. Chade faz o contraponto: no Brasil, quase 40% dos gastos da Copa foram com estádios, nem sempre em locais adequados.

Trata-se, portanto, de precioso trabalho de pesquisa jornalística de quem, de antemão, esclarece, de forma taxativa, não se tratar de um livro contra o futebol, contra as Copas ou contra essa Copa de 2014. Mas, parafraseando o próprio autor, com a devida vênia, “uma tentativa de mostrar que precisamos ser uma espécie de torcedor-cidadão, que claro apoia a seleção, mas não sem saber o que de fato representou essa Copa”. Enfim, trata-se de um livro que foge da propaganda oficial da Copa e que conta os bastidores políticos e comerciais do maior evento hoje do mundo.


Para quem se interessar, boa leitura!

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